terça-feira, 22 de novembro de 2011

O Palhaço


A comédia dramática O Palhaço, de 2011, encanta pela simplicidade. O filme nos coloca em contato com a arte circense, mas mais do que isso, nos coloca em contato com a emoção do artista, dentro e fora dos palcos. Selton Mello, responsável pela direção e roteiro do filme, é o palhaço Pangaré, que junto com o pai, o Palhaço Puro Sangue, interpretado por Paulo José, mantém o itinerante Circo Esperança. Além destes, cerca de outros 10 artistas fazem parte da trupe onde todos fazem de tudo, desde a montagem da tenda até a iluminação dos espetáculos. Ao acompanhar as divertidas apresentações e as viagens do grupo pelas estradas de Minas Gerais, identificamos as dificuldades financeiras e os anseios por melhoras modestas, como o pedido por um sutiã novo. Ainda assim, sentimos predominar a alegria e união entre os artistas e a dedicação em fazerem o que gostam.

Pangaré, por outro lado, referência e espécie de conselheiro do grupo, mantém-se firme no palco, mas fora dele não revela alegria no olhar. Sentimento sugerido pela própria maquiagem que, propositadamente, insiste em lhe conferir uma lágrima. O humilde e bondoso palhaço angustia-se pela realização de pequenos desejos, como a emissão da carteira de identidade e a compra de um ventilador. A certidão de nascimento, único registro disponível, encontra-se velha e insuficiente nos momentos em que mais precisa. O ventilador, caro e inacessível. Ambos símbolos de algo maior para um artista que, melancólico, questiona a própria identidade, sem entender a vocação de fazer rir, e que sente o peso da responsabilidade perante o grupo, como se realmente lhe faltasse paz e tranquilidade, como se de fato lhe faltasse o ar.

Exemplos disso são as alucinações de Pangaré diante de um ventilador, imaginário ou não, e as repetidas cenas em que, sozinho na cama, enquadrado em plongé e plano fechado, parece não conseguir se acomodar, sem encontrar uma posição confortável. Mesmo nestas situações de angústia, o brilhantismo de Selton Mello confere irreverência em cada cena. Um trabalho perfeito ao mesclar adequadamente a tristeza a trejeitos incomuns, sotaques, falas arrastadas, expressões faciais quase infantis e exagero sentimental.

Neste cenário, O Palhaço mistura situações de humor e outras altamente emotivas, conduzidas por uma trilha sonora com sons que sugerem o lúdico, o campo e a natureza, além de uma fotografia predominantemente focada em cores leves e com cenas gravadas pela manhã, o que contribui para a atmosfera suave da obra. As cenas à noite acabam por revelar situações mais angustiantes e tumultuadas, como aquelas ligadas à briga e traição, mas também são o palco para a alegria dos espetáculos.

Entre figurantes, protagonistas e personagens com passagens marcantes, mas breves, as idas e vindas do Circo Esperança nos conduzem em uma agradável caminhada. No caminho da trupe, destaques como o hilário delegado vivido por Moacyr Franco, que divaga intermitentemente para demonstrar a insatisfação de estar na delegacia e não em casa cuidando do gato de estimação, além do experiente interiorano vivido por Jackson Antunes que, longe do humor, transmite belas mensagens ao grupo.

Uma destas mensagens, inclusive, será a chave para o despertar de Pangaré. Desassossegado, com uma inquietação crescente no ambiente do circo, o palhaço parte em busca do que nem mesmo ele sabe o que é, mas acredita precisar encontrar. Em um dos pontos altos do filme, quando, junto a Pangaré, nos distanciamos da trupe e dos espetáculos, entendemos a certeza que faltava ao artista: o valor de fazer o outro sorrir. Em uma belíssima cena em que, ao ouvir um piadista, compreende essa verdade e ensaia finalmente um sorriso verdadeiro, Pangaré retoma a esperança. E como no próprio circo, também reanimado pela presença de uma criança, dá lugar a uma nova vida.

Por Rafaella Arruda

4 comentários:

  1. Oi Rafa,
    Adorei seu texto. Esse filme tá na minha cabeça desde o dia que assisti. É um filme muito sensível e delicioso! Depois vamos conversar sobre ele! Beeeijo,
    Ana

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  2. Oi Aninha! Obrigada pelo comentário! O filme é realmente sensacional. Vamos conversar mais sobre ele sim. Bjos.

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  3. Que lindo, Rafa! Conseguiu passar a emoção de cada cena.

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  4. Obrigada, Camila! Que bom que gostou. Bjão

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